terça-feira, 6 de abril de 2010

AMIGOS FAZENDO UMA ESPÉCIE DE JOGO DA VERDADE COM JOGO DO COPO

B- Queria propor da gente ficar a luz de velas e fazer confissões.
D- Pornográficas?

(ninguém responde)

B- Tudo que for dito aqui hoje morre aqui hoje certo? Vamos brindar nossa amizade assim. Confessando nossas fraquezas.
H- Acho perigoso
D- Eu começo.

(D deita no chão perto das velas e fecha os olhos)

D- Tenho medo de não fazer a coisa correta. Tenho medo de ser castigada. Tenho medo de morrer cedo.
Tenho medo de, sei lá, acontecer alguma coisa grave com a minha saúde. Tenho medo de escuro. Tenho medo de espírito.
Tenho medo de ficar velha.
Velha e feia. Tenho medo de ficar enrugada. Tenho medo de ficar gorda. Tenho medo de ficar com muita celulite. Tenho medo de ser fútil demais de ser profunda demais.
Ta me escutando?
Vc ta escutando?
(insegura) Vc ta? Escutando?
(chama) Helloo? Hello!!
Vc ta me escutando?
Vcs podem responder?

Vcs podem responder? Vc ta me escutando? (nervosa) Porque eu não gosto de falar sozinha.

Eu não gosto de... quer dizer.. ficar assim falando sozinha parece que eu sou louca então eu queria que por favor... tem alguém aqui ainda escutando o que eu to falando?

(pausa)

Vcs podem dar um suspiro?
Um barulho qualquer pra eu saber.. porque eu não quero abrir os olhos e... fazer alguma coisa errada então.. eu quero saber se eu to indo pelo caminho certo.. então.. Hello???..
Amigos...
Eu sei que tem alguém aqui porque eu ouvi um.. como é mesmo o nome disso?
Pigarro!
Eu ouvi um pigarro.
Eu tenho medo de ficar velha e pigarrenta.
Eu tenho medo de ficar velha, feia e pigarrenta...
Tenho medo de me olhar no espelho.
Hello amigos.

(D abre os olhos, percebe que está no escuro e sozinha então tenta mexer no rádio pra escutar música.)


(A recomeça o jogo)

A- (para C) Quero ouvir vc.
D- Pode falar.
C- Esse é meu medo. Tudo que eu quero falar eu acho que é ridículo.
D- Ridículo? Vc se acha ridícula?
C- (suspira) Não sei. (pausa) Tenho medo de tudo, de tudo. Já falei tudo que eu tenho medo. Até lembrei um dia de alguma coisa que eu não falei aquele outro dia..mas agora não lembro.. (ri se parar)
D- Qual a graça? Ta nervosa? Ta com medo?
C- Eu não sei o que falar.. (suspira) tenho medo de..... tenho medo de mim.
D- Tem medo de vc?
C- (emocionada) Tenho. (pausa) Que cheiro horrível! Gente pelo amor de deus.. tenho medo de partes do corpo, de corpos.. (pausa) tenho nada de interessante pra falar. Sinceramente.
D- Nada de interessante?
C- Nada, absolutamente nada.
D- Nada de interessante?
C- Nada de interessante. Minha mente ta preta.
D- Preta?
C- É..
D- Nada de interessante?
C- Eu sempre acho que não tenho nada de interessante.
D- Vc tem medo de ser desinteressante?
C- Tenho. É horrível. É horrível. (chora)
D- Horrível?
C- É horrível se cobrar, é horrível, eu não sei se eu sou forte ou se eu sou fraca
D- Vc é fraca.
C- É. Porque as pessoas falam e acham que eu sou forte..
D- As pessoas acham e falam.
C- É.. algumas pessoas já falaram, vc é tão.. não sei o quê.. tão dedicada, tão madura...
D- Má dura ?
C- É... madura.. é..
D- Má? Dura?
C- Vc acha que eu sou má?
D- E vc acha que eu sou má?
C- É...Eu to má mesmo viu. To má mesmo, sacaneando todo mundo, lá no trabalho to sacaneando todo mundo.. to adorando...Ta vendo? Falei falei falei e não falei nada.. até chorei..
D- To adorando.
C- Tá nada, vc tá é me imitando.
D- To má, to adorando...Vc acha que eu sou má? (pausa) To má... to sacaneando todo mundo... to adorando...
C- Poxa não quero ficar igual a minha mãe.. lembra que meu apelido era mãe? tenho medo de ficar igual a minha mãe.. (chorosa)
D- To má.
C- To sacaneando todo mundo.. mas eu não quero ser mãe..
D- Mãe..
C- (chora)
D- Mãe
C- (chora)

F- Uma questão forte pra mim é o tempo. Passa rápido demais. Consome o corpo da gente. No ano passado em Londres eu vi um quadro que, bom, poucos quadros mexem comigo, mas esse eu voltei no museu 4 vezes pra ver.. o nome do quadro é “o tempo coordenando a velhice pra destruir a beleza”, alguma coisa assim... de 1746. Ou 45.
B- Mas o que que te chama tanta atenção?
F- O tempo que consome nossa juventude.
C- Ah.. eu sei, tem um Anjo com uma ampulheta na mão.
F- É. O Anjo é o tempo. Um quadro do tamanho da parede. A Juventude, quer dizer, a Beleza ta iluminada nesse quadro.
B- E o medo?
C- Medo da morte. Porque não existe momento que a gente fique mais sozinha.
F- Conheci uma figura que não tem medo. Ela diz que quando sente dura 1 segundo e passa logo. Ela diz que tem “cisma” com altura porque dá dor nas costas. Não medo, cisma. O meu problema é perder o controle do meu corpo. Tenho medo do meu corpo me trair, de ficar preso no meu corpo... essa consciência contínua do tempo passando...

(pausa)

Tenho medo de perder a matéria.
Essa contagem regressiva. O meu corpo que enfraquece e a minha mente que fortalece. Essa contagem regressiva.
Tenho medo de ir ao médico e ter um diagnóstico ruim.

H- Chega!

(silêncio)

H- Só quero avisar que vou começar a chorar.

(chora)

H- (doce) Tenho medo que ninguém me enxergue, de não ser vista.
Tenho medo de estupro. E que o papagaio da minha madrasta me pique.
Desculpa. Não consigo pensar em nada. Devo ter outros medos. Vou descobrir, eu acho... Medo de solidão e sofrimento. E de não me aceitarem. (chora)

(E vai buscar o espelho do banheiro e deita ao lado de H. Os dois ficam se olhando através do espelho)


E- Eu sou meio neurótico. Detesto a ignorância das pessoas. Tenho medo de saber demais e de ser tachado por isso. E também não quero ser só mais 1 no mundo. Tenho medo de perder meu equilíbrio. De dar estrela, de dar mortal. De decepcionar, de parecer esnobe, de ser julgado.
Tenho medo de não conseguir terminar o que eu comecei. Tenho medo da verdade. Tenho medo de ser cafajeste. Tenho medo de pensarem que eu sou cafajeste. Tenho medo de pensarem que eu não sou bom. Tenho medo de não ser bom em nada.
Tenho medo de acreditar demais nos meus ideais.
Tenho medo de uma conspiração.
Tenho medo de enlouquecer.

D- Vc ta falando de mim?
E- Não.
D-Vc ta falando de mim sim. Vc ta roubando os meus medos.
E- Não.
D- Por que vc ta implicando comigo hoje?
E- Eu não estou falando de vc.
D- Prova.
E- Quê?
D- Prova que vc não ta falando de mim.
E- Ah pára.


(A começa a cantar fino no canto da sala totalmente alheio ao que está acontecendo)

D- E vc? Não tem medo de nada, não fala nada... fica aí alheio..
A- Pois é.
D- Me diz aí o que que eu faço com o meu medo de escuro?
A- Acende a luz.
H- E o meu medo de solidão?
A- Vai pra rua ver gente.
C- E se eu me sentir só mesmo cheia de gente?
A- Ah.. sei lá.. faz um filho.
G- E o meu medo de...
A- Ah caralho! Vai dormir que passa!



D- Vou embora! Tenho inveja de vc!

3 comentários:

  1. lembrei das fornicações da minha pré-adolescência... peguei a mina mais gata da rua através dele. sou grato ao jogo do copo.

    Detalhe: A mina da época do "Jogo",... agora é pastora evangélica e tá gordinha.

    Felicidades....

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  2. to ansiosa pra ler seu livro! ainda nao consegui parar pra ler com calma, dei uma olhada rápida, acho que vou adorar!
    bjo

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